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Movimento Sobre Rodas Paradas - Dica

*A peça estará em cartaz dias 24 e 25/11, sábado e domingo, às 19h30min, no Teatro Renascença e no estacionamento do Centro Municipal de Cultura.

Como falar de um espetáculo cheio de surpresas sem tirar-lhe a graça? "Movimentos sobre Rodas Paradas" é assim. Só podemos realmente falar sobre ele com quem já o assistiu. Não há nada que possa ser dito, sem cometer algum “spoiler”. Falar sobre o que acontece nesse espetáculo com alguém que não o tenha visto é, de certa forma, traí-lo. Tentar narrar o que acontece durante as cenas que se sucedem num ritmo vertiginoso é condená-lo e diminuí-lo. É um espetáculo que precisa ser visto mais de uma vez para que possa ser compreendido com a profundidade que merece. Trata de temas como o casamento em ruínas, a falta de amor, as fantasias de um casal, a degradação imputada ao artista, a solidão e a tentativa de tornar a realidade mais palatável. Tentar narrá-lo é tirar-lhe o que tem de mais interessante, a ação dramática.

O espetáculo é, na sua essência, uma avalanche de surpresas - do início ao fim, da primeira à última cena. Quando o assisti, saí em êxtase. É o teatro na sua mais bela acepção: simples e, ao mesmo tempo, contundente. O cenário onde tudo acontece é um estacionamento. Um local pouco provável para um espetáculo teatral onde, ao final, tudo acaba fazendo sentido - até o nome. Viradas espetaculares e antológicas tornam o texto mais e mais interessante na medida em que as cenas vão se desenrolando cheias de humor. É um tipo de humor refinado e sarcástico em que nos surpreendemos rindo de algo patético ou até triste. E é, nesses paradoxos, que o espetáculo acontece.

Já na cena inicial temos uma pequena amostra do que deve acontecer nas seguintes: muitas surpresas. Liane Venturela, a única mulher do elenco, encarna uma agente de turismo divertida, construída sobre uma forte caracterização. A personagem vai do cômico ao trágico. Liane brilha como sempre. Um desempenho estupendo e o desenlace não poderia ser diferente.Essa é a tônica de toda a narrativa: uma sucessão de pequenas cenas formando um caleidoscópio de tipos como em um quadro constrangedor, risível e desconfortável na medida em que as personagens se constroem e se desnudam. Quem imaginaria que aquele de quem ríamos é um homem à beira de uma crise e cheio de problemas no casamento?

Certa compaixão nos toma diante dos dramas banais e comuns. Mas que, naquele formato, ganham enorme dimensão na direção precisa de Carlos Ramiro Fensterseifer. Nada é excessivo. Nada é por acaso. Não tem enfeite, não tem firulas. É teatro, é teatral e é essencial.Nelson Diniz, que escreveu o texto, também interpreta alguns papéis. O texto é rápido, direto e, por vezes, ensurdecedor. Como não se comover diante da realidade que as suas personagens nos apresentam? Uma realidade cotidiana e, ao mesmo tempo, estranha. Nelson demonstra uma maturidade artística consistente. Ator de teatro e cinema, recentemente nos apresentou seus talentos como fotógrafo com a exposição “As Mulheres em Mim”. Agora, como dramaturgo, soube colocar na voz das suas personagens os mais impensáveis dramas de um cotidiano terrivelmente próximo.

Nada seria tão estranho se não fosse teatro. Se os personagens não estivessem ali à nossa frente a falar diretamente ao público das suas mazelas. O motorista pede desculpas aos presentes e desaba. Escancara diante da esposa o fiapo que sustenta aquele casamento. O desastre da sua vida pessoal. Tudo que começou engraçado descambou e estamos a ver aquilo que imaginamos realidade escapar de nossas mãos. Não estranhe se você rir e chorar com a mesma personagem. Assim é "Movimentos sobre Rodas Paradas".

A opção do grupo, com dez anos de atividade, em usar um espaço alternativo surgiu na estreia quando ocupou o estacionamento de um teatro abandonado na Cidade Baixa. Nada mais potente do que aquele início de carreira para o espetáculo de um grupo de artistas que tem demonstrado muita maturidade artística em todos seus empreendimentos. Vida longa, In-Co-Mo-De-Te!

Marco Fronckowiak e ator e diretor teatral

(Foto: Adriana Marchiori)

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