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Tânia Farias: uma atriz de grupo

Tânia Farias se destaca como uma das atrizes brasileiras mais prestigiadas na atualidade. Ela atua na Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz. Este ano, durante o Porto Alegre Em Cena, será lançado um livro sobre a sua trajetória dentro da coleção Gaúchos em Cena, escrito pelo jornalista Fábio Prikladnicki.

A atriz ingressou em 1993 na Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz, que surgiu em 1978, a partir da percepção de uma desconexão do teatro com o momento político. Com a iniciativa de subverter a estrutura das salas de espetáculos e de levar o teatro para a rua, ela foi um marco na cena gaúcha. Desde lá ela ocupa um papel de liderança no grupo, ao lado de Paulo Flores, fundador do coletivo.

A organização da Tribo é baseada no trabalho coletivo, tanto na produção das atividades teatrais, como na manutenção do espaço. Seu centro de produção ocupa lugar de destaque entre os espaços culturais do Estado. Funciona como escola de formação de atores e como ponto de fomentação da criação artística.

Tânia foi indicada ao Prêmio Shell de Melhor Atriz por Kassandra In Process (2007). Atualmente ela circula com dois trabalhos: Caliban – A Tempestade Augusto Boal (2017) e a desmontagem Evocando os mortos – Poéticas da experiência (2014).

Tânia Farias na peça "Medeia Vozes" Foto: Pedro Isaias Lucas

Cênicas – Michele Rolim: Como surgiu a Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz e como tu te inseres nesse grupo?

Tânia Farias: O grupo se forma a partir da percepção de uma desconexão do teatro com o momento político. Naquela época, o teatro mais politizado que acontecia na cidade, para esse grupo de jovens, era um teatro que seguia a linha do teatro burguês. Então, o Oi Nóis surge com a vontade de falar coisas num momento em que se pode falar muito pouco no Brasil, porque estamos em plena Ditadura, mas, ao mesmo tempo, desde o princípio, tem esse dever de romper, de criar uma linguagem própria, uma estética que seja sua. Desde o princípio, não vai se dispor a fazer teatro no palco italiano. A pesquisa do Oi Nóis parte daí: estética e temática. Eu entro no grupo em 1993.

Michele: Vocês vêm buscando quais referências?

Tânia: O Oi Nóis vai se pautar muito pelo exemplo do Living Theatre, do teatro de contestação norte-americano e por pensamentos como, por exemplo, o do Artaud. E, com o tempo, o Oi Nóis vai fundindo a ideia de Artaud e Brecht no seu trabalho. Claro que mesclando um montão de coisas, o Arrabal foi, e com certeza é ainda, uma influência muito forte, a ideia do Teatro do Pânico do Arrabal. Com o passar do tempo, o Oi Nóis vai beber muito do Grotowski pra construir o seu ator, essa presença cênica.

Michele: E como tu localizas o Oi Nóis dentro do cenário teatral da cidade? Porque o Oi Nóis é um grupo que existe há bastante tempo na cena local.

Tânia: O Oi Nóis é um grupo responsável pela formação da maior parte dos atores da cidade. Quase todos os grupos têm alguém que passou pela escola do Oi Nóis ou que foi do Oi Nóis. Enfim, que formou-se dentro do dia a dia do grupo, desse trabalho, que é de pesquisa permanente. Vemos rastros do Oi Nóis no teatro da cidade toda. Acho que, nessa medida, o Oi Nóis tem um projeto pedagógico muito forte; e eu acho que isso, ao invés de reduzir, tem se ampliado mais e mais; porque, se a principal fonte de formação dentro do Oi Nóis era estar no grupo, hoje a escola supre isso de uma forma maior e mais profunda. Então, acaba que ampliou ainda mais a formação que o Oi Nóis oferece na cidade. E eu acho que, nessa medida, esse é um lugar que o Oi Nóis ocupa muito fortemente. O Oi Nóis é um grupo que partilha o tempo inteiro. Então, mesmo quando estamos fazendo um espetáculo, estamos pesquisando uma temática específica, sempre vai gerar um seminário aberto para a cidade. É, principalmente, pra suprir uma demanda interna de pesquisa do grupo, mas que, naturalmente, como uma vocação, vai ser compartilhado com todo mundo que quiser, de forma aberta e gratuita. E eu acho que isso está na essência do Oi Nóis. E o Oi Nóis é um grupo de muito intercâmbio quase que o tempo inteiro. E são sistemáticas: fazemos praticamente dois seminários por ano. E aí começamos a fazer o festival, que é outro momento intenso de compartilhamento; então, isso é uma questão pro Oi Nóis, isso também marca um lugar que ele ocupa.

Michele: Isso que tu falaste, enfim, vocês têm esse intercâmbio intenso, volta e meia está acontecendo uma residência aqui e tem esse festival, quais são as principais referências de grupos com as quais vocês dialogam?

Tânia: Dialogamos com bastante gente. Ao longo de um ano passam muitos grupos por aqui, várias vezes. São grupos que se identificam com a cena ou com a estética do Oi Nóis; outros se identificam com os anseios, as inquietudes políticas do trabalho do Oi Nóis. Então, por diversos motivos diferentes, encontramos os grupos. Eu acho que, nessa medida, o Oi Nóis tem intercambiado com todo o Brasil, porque nos colocamos fortemente como um coletivo, como um grupo de teatro, e acho que isso é uma corrente forte do teatro brasileiro – que teve o seu momento forte, o seu momento de desestabilização, a sua retomada na década de 90, e que é responsável pela pesquisa mais profunda em teatro no país. O avanço das artes cênicas no país são os coletivos de trabalho continuado.

Michele: Tem como tu dizeres alguns de cada região?

Tânia: Tem o Galpão, que é amigo de longa data, que são parceiros constantes. Na primeira vez que o Latão veio a Porto Alegre, o Oi Nóis chamou o Latão pra conhecer a Terreira, pra dialogar; e, desde então, temos um contato permanente. Têm mais alguns da antiga, tipo o Imbuaça, em Aracaju; tem o Tá na Rua, no Rio de Janeiro; tem, no interior de São Paulo, o Contatores de Mentira. Temos estabelecido um diálogo muito bacana justamente dentro dessa linha: teatro de grupo e trabalho de ator. Aqui em Porto Alegre, temos um contato muito bacana com a Cia. Stravaganza,UTA - Usina do Trabalho o Ator e Terpsí Teatro de Dança

Certamente eu vou deixar de falar um monte de gente legal.

Michele: E aqui na América Latina?

Tânia: Eu acho que o contato com o Yuyachkani, do Peru; trouxemos eles várias vezes com diferentes trabalhos, assim comoem o Malayerba, que é do Equador.. Tem o Teatro de Los Andes, da Bolívia, que também é um grupo que temos contato e que foi sempre muito bacana encontrá-los. Conhecemos o El Baldin, da Argentina, de Buenos Aires, que também é um grupo que tem muita coisa a ver conosco, tem uma escola, tem publicação, tem um festival, fazem coisas semelhantes. E eu conheci também, e acho que foi um encontro bem profícuo, o Mapa Teatro, de Bogotá, que trabalha com a performance. Enfim, são vários exemplos que são instigantes pro nosso trabalho, que fomos encontrando por aí.

Michele: Vocês são um dos poucos grupos do Estado que, efetivamente, se preocupam com a questão da memória. Produzem vídeos, revista e um festival. Como que tu vês a ocupação desse espaço da memória na cidade?

Tânia: O Oi Nóis percebe que não há, de fato, preocupação de registro do teatro que é feito fora desse eixo comercial, do Sudeste. Desde que começamos a publicar os livros, temos a preocupação de fazer uma ampla distribuição, para que bibliotecas de universidades, grupos de teatro, tenham esses livros. E a percebemos o quanto esses livros hoje são referências pra trabalhos acadêmicos, dissertações e teses. O Oi Nóis acabou preenchendo um vácuo aqui no Estado. Dialogamos com outros grupos que têm revista, a gente dialoga com universidades e cursos que desenvolvem pensamentos e acabam tendo essa preocupação de registrar e compartilhar. Percebemos o quanto a nossa revista Cavalo Louco é bem distribuída, com toda a nossa dificuldade de ser um grupo de teatro que não tem uma grana permanente, que as granas são eventuais e esporádicas.

Michele: Como tu vês a questão de financiamento, a própria questão dos editais, de leis de fomento. Vocês estão numa batalha para a construção de uma espaço. Como tu enxergas essa questão? E como isso influencia o trabalho?

Tânia: Acreditamos que um trabalho como o do Oi Nóis – que nós não estamos sozinhos evidentemente, mas temos uma preocupação enorme de compartilhar com a cidade o conhecimento, o seu fazer, a casa, diariamente – é um trabalho público. Estamos falando aí de arte pública, no nosso entendimento, e é só por isso que acreditamos que um trabalho desse tipo precisa ter política pública pra existir. Isso faria, certamente, com que mais pessoas pudessem acessar esses trabalhos, mais pessoas pudessem beber dessa fonte maravilhosa de manter-se instigado com a pesquisa e o desenvolvimento do teatro e com a potência crítica que ele pode e deve ter. Então, por aí, não podemos deixar de falar que não temos essa política pública. Tem sido muito difícil existir. Os governos mudam, e ninguém reconhece o que existe há tanto tempo e que segue. O Oi Nóis não é um grupo parado no tempo: é um grupo que tem o mesmo ímpeto de quem tem três anos de trajetória, porque segue pesquisando, faz trabalhos que, ainda hoje, são trabalhos que propõem uma renovação da linguagem. Então, tem que ter algo que ampare esse tipo de trabalho, o trabalho que está começando e o trabalho que já existe, porque todos precisam de estímulo; e acho que um grupo como o Oi Nóis e outros como o Oi Nóis espalhados pelo Brasil precisariam de uma política efetiva para, simplesmente, garantir a sua existência, garantir condições para que esse trabalho siga sendo feito da melhor maneira possível. Vivemos um estado permanente de risco; a qualquer momento um coletivo desses pode acabar – e isso é uma perda não possível de mensurar. Pensar que um grupo como o Galpão pode acabar, um grupo como o Oi Nóis pode acabar, um grupo como o Latão pode acabar, porque não tem mais condição de trabalhar. Isso é um risco e uma perda para a sociedade. Toda vez há cortes, e o primeiro lugar que se corta é a cultura, porque ela não importa. Eu acho que o Brasil precisa urgentemente de políticas públicas para esse tipo de trabalho, a nível federal, estadual, municipal; precisamos urgente criar essas políticas.

Michele: O que mudou da cena quanto tu entras e da cena agora? Em termos, também, de espaço, de políticas, em termos de produção, de público, se aumentaram ou diminuíram os grupos, pensando aqui em Porto Alegre.

Tânia: Eu acho que aumentaram os grupos. Não temos problema de público; o Oi Nóis é um grupo que se preocupa com o público o tempo inteiro. Temos uma mostra permanente, que acontece nos bairros, que acontece aqui, na sede da Terreira, que acontece nos teatros. Nos preocupamos com aproveitar cada um desses instantes pra formar plateia, pra formar gente que assista teatro, uma vez que se perceba gostando de teatro, possa desejar voltar ao teatro. Temos trabalhado com escolas que, constantemente, têm trazido os alunos pra assistir. O Oi Nóis faz isso o tempo inteiro, e eu acho que isso é uma maneira de irmos, aos poucos, mudando essa realidade. Também sabemos que existe um trabalho enorme pra que as pessoas não estejam nesses lugares, porque são lugares de encontro e, cada vez mais, a ideia é de que não se encontre. Lugares de encontro são perigosos, são quase subversivos. É isso, a subversão hoje é encontrar-se. Por isso que ninguém quer que estejamos na rua, por isso que um Largo Vivo é subversivo. Porque as pessoas estão ali, juntas, trocando ideias, bebendo, se divertindo, movimentando o corpo, ou seja, elas estão vivas.

Michele: E o que tu achas que mudou em termos de produção lá ainda no início da década de 80 e agora? De produção da cena, em relação à linguagem, aos temas também.

Tânia: Eu acho que, de lá pra cá, muita coisa mudou, e acho que muita coisa mudou com esse clique – como pesquisadora eu estou te dizendo. Eu peguei pra ver como era o teatro, o contexto teatral quando surgiu o Oi Nóis, pra entender de onde sai o Oi Nóis. Daí eu comecei a buscar essas imagens; e, muitas vezes, eram programas de televisão que tinham informações de vários trabalhos – e aí tu vê o que o Oi Nóis significou para o teatro gaúcho. Eu sinto que, hoje, o teatro, se comparado com naquele momento, ele se coça mais nesse sentido estético.

Personagem Sofia, do trabalho “Viúvas Performance sobre a Ausência" Foto: Pedro Isaias Lucas

Michele: E tu acha que como, por exemplo, os festivais influenciaram isso? O Porto Alegre em Cena, o Palco Giratório, o Festival de Rua?

Tânia: Eu acho que é muito bacana essa coisa da possibilidade de tu ver outros trabalhos de outras terras. É, com certeza, uma oportunidade singular de poder encontrar com vários artistas que são referências. Eu acho que os festivais cumprem uma função muito importante. Embora eu, Tânia, tenha uma crítica à forma como as coisas se organizam, porque eu acho muito estranho que, num país em que não temos recursos pra uma política pública permanente pra fomentar a permanência dessa pesquisa, nunca falte dinheiro pra fazer festival. Por que não temos uma política pública pra esse fazer e um fomento permanente pra pesquisa dos grupos, mas não deixamos de ter dinheiro pra fazer festival? Mal ou bem, os festivais seguem acontecendo, ora com mais dinheiro, ora com menos, mas sempre com dinheiro público. Então, existe dinheiro público: eu só me incomodo que haja essa discrepância entre o evento e a atividade continuada, porque, daí, eu não consigo achar que é mais importante o festival do que o fomento à pesquisa. Até pros festivais terem trabalhos mais interessantes do Brasil pra mostrar.

Michele: Na questão da dramaturgia – que vocês trabalham muito isso, de criar uma dramaturgia coletiva –, como tu vês essa produção do Oi Nóis em relação ao cenário nacional? Porque aqui sabemos que se diferencia bastante, mas em relação ao cenário nacional?

Tânia: A criação coletiva é um fenômeno mundial que aconteceu com o teatro, na América Latina fortemente. Tem um momento em que vamos começar a falar de processo colaborativo, que hoje foi adotado por diversos coletivos no país. O Oi Nóis não está nesta ideia de processo colaborativo: o Oi Nóis segue a ideia da criação e direção coletiva. Seguimos afirmando essa possibilidade. E também chamando a atenção para o fato de que as pessoas falam que não há uma direção, quando, na verdade, há uma direção. A direção coletiva não é a ausência de direção: é a direção feita com muitos olhares, corpos e mãos. E eu acho que aí o Oi Nóis, em relação ao resto do país, realmente ficou num lugar diferente. O espaço do ator no processo criativo é imenso: nós somos os criadores do espetáculo e somos os diretores do espetáculo. Então, a encenação é nossa, realmente nossa.

Michele: Em relação, por exemplo, à premiação – que acabam, de uma maneira ou outra, também legitimando pra outros lugares esse trabalho –, teve um tempo em que o Oi Nóis não recebia essa premiação. Kassandra teve um reconhecimento nacional, mas não no Estado. Como tu vês esse lugar da premiação?

Tânia: Eu acho que, durante muito tempo, não foi interessante reconhecer o trabalho do Oi Nóis. Eu acho que houve uma sistemática de colocar o Oi Nóis num lugar bem marginal, à parte. O Oi Nóis nunca foi de partido nenhum. Então, quando tinha uma coisa politicamente conchavada, o Oi Nóis sempre esteve fora. O Oi Nóis nunca foi do boteco, de ficar lá a noite inteira conversando com a classe teatral. =Começamos a ver que, às vezes, por uma coisa ou outra, por simpatia, ou por uma questão política, o cara não quer realmente que tu seja reconhecido porque as tuas ideias não são bem-vindas. Então, é uma posição, e o Oi Nóis sempre marcou uma posição, sempre diz o que pensa, e sabemos que isso é uma coisa que incomoda. O Amargo Santo da Purificação não teve dinheiro nenhum da cidade pra fazer; eu inscrevi várias vezes no Fumproarte, e não ganhamos nunca porque nós queríamos falar sobre o Carlos Marighella. É a censura. De várias maneiras diferentes, ela continua aí. Então, acabamos tendo que relativizar as coisas da premiação, porque tu sabes que o que evidencia muitas vezes não é só a qualidade do trabalho: às vezes, depende do interesse que isso aconteça ou não. E eu acho que têm momentos que a coisa fica mais leve. Acho que depende muito de quem está na coordenação, de quem orienta o processo todo.

Michele: Mas mudou nos últimos anos?

Tânia: Mudou, mas o problema é que muda toda hora. A máquina é a mesma, mas aquele ser que está atrás daquela mesa faz diferença. Porque tu podes chutar o balde; e tu podes ficar só dizendo sim, fazer o teu mandato, ganhar o teu salário e fazer nada. Ou tu podes questionar que as coisas não podem, não devem ser assim. Eu acho que sim, que mudou muita coisa nos últimos tempos, algumas para melhor, e algumas pra pior. É uma lástima o que aconteceu com a descentralização da cultura em Porto Alegre, por exemplo. O desmantelamento completo de um projeto muito bonito, que construimos, que é fazer com que a cultura chegue à maior parte da população, que ela vá até os bairros distantes do Centro. Para que eles façam também, pra que eles produzam também teatro, dança, cinema, música. Então, é um projeto que eu considero fundamental, que é o nosso Teatro Como Instrumento de Discussão Social. Seguimos fazendo.

Michele: Falando aqui um pouco da cena, tu achas que, nesses últimos anos, está tendo uma mistura maior de teatro com performance? Até o trabalho de vocês, como que tu vês isso em Porto Alegre?

Tânia: As pessoas estão vendo, estão lendo, estão experimentando coisas pra sair do seu lugar-comum. Mas, na verdade, a performance está no trabalho do Oi Nóis antes de eu entrar no Oi Nóis. Têm registros de várias coisas superdoidas quando eu nem era nascida pro mundo. Experimentos com vídeo e corpo, a mescla de artes visuais com performatividade, coisas que o Oi Nóis fez e, enfim, não estava nem preocupado em chamar de performance. O que ainda me incomoda é que eu acho que talvez seja um certo provincianismo; e eu acho que isso, às vezes, está dentro da universidade: de querer encaixotar tudo. Isso é tão burro, porque está tudo muito contaminado. A dança não é mais só dança, o teatro não é mais só teatro. Então, falar de performance e querer colocar a performance numa caixinha eu acho muito burro. Então, temos feito coisas por provocação: não venha querer dizer que aquilo que eu estou fazendo não é performance.

Michele: O que tu vês da cena gaúcha, teatral, que diferencia do resto do país? Algum aspecto que tu achas que é característico daqui, olhando pro Oi Nóis, mas olhando também pra cena local.

Tânia: Eu não sei te dizer. Eu não sei dizer uma característica. Tem uma coisa que eu vejo em alguns lugares do centro do país, tipo Rio e São Paulo, que a mim me incomoda e eu percebo assim. Não posso dizer que isso difere toda a cena gaúcha, por exemplo, da cena do eixo. Mas eu posso dizer que difere o nosso trabalho desse trabalho. Eu acho muito estranho que, num trabalho, na perspectiva de grupo, o mesmo ator participe de vários trabalhos diferentes ao mesmo tempo. Me dá um pouco de sensação de superficialidade. Eu posso fazer várias coisas porque eu, de fato, não vou me aprofundar em nenhuma. Não é possível: uma pessoa não consegue se aprofundar muito em mil coisas. E se ela faz um trabalho, como ator, em vários grupos diferentes, trabalhando estéticas diferentes, temáticas diferentes, de que jeito essa pessoa vai estar? Então, eu sei que, em São Paulo, tem muito a cultura do ator avulso, que é de um grupo, mas é de todos ao mesmo tempo. Eu sou uma atriz de grupo. Embora, sim, nada me impeça de participar porque um grupo me convidou, fazer uma coisa pontual. Mas é a Tânia do Oi Nóis a quem ele convidou. Eu sei que a Tânia que ele convida é a Tânia que tem essa trajetória. Se eu vou lá fazer esse trabalho, eu continuo mantendo um vínculo, eu vou com essas ideias, essa pesquisa profunda que eu desenvolvo aqui.

Atuadora apresenta a desmontagem "Evocando os Mortos - Poéticas da Experiência" Foto: Rafael Saes


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